A recuperação judicial tem por objetivo possibilitar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica.

Em outras palavras a empresa devedora, a qual pode ser chamada de recuperanda, pleiteia ao Poder Judiciário, a autorização para por em prática um plano para reorganizar as suas dívidas e finanças; este plano, é literalmente chamado de ‘Plano de Recuperação Judicial’.

Se atendidos os pressupostos processuais, o juiz defere o processamento da recuperação judicial onde começa a surtir efeitos no planejamento da empresa, entre eles, inicialmente, o juiz determina que as ações de execução, que tramitam em face da empresa recuperanda, sejam suspensas pelo prazo de 180 dias, uma vez que as respectivas dividas deverão constar no plano de recuperação para serem adimplidas.

Assim, a empresa, através de um Administrador judicial, tem seus ativos financeiros relacionados, bem como, as dividas, para por em prática o plano de recuperação, que visa quitar os débitos, de maneira que não ocasione o fechamento [a falência] da empresa.

Contudo, conforme novo entendimento jurisprudencial, nem todos os ativos financeiros em posse da emprese recuperanda, é passível de se submeterem aos efeitos do processo de recuperação.

Conforme decidido pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ (REsp 1.736.877), “os valores pertencentes a terceiros que estejam, em decorrência de contrato, na posse de sociedade em recuperação judicial devem ser excluídos dos efeitos do processo de soerguimento”.

O respectivo caso consistia num recurso de duas empresas, com o intuito de retirar cerca de duzentos e oito mil reais, dos efeitos da recuperação da empresa recorrida, que foi contratada pelas recorrentes para prestar serviços de administração financeira, promovendo cartões de crédito aos seus clientes.

Conforme as empresas contratantes, quando os clientes realizavam compras com os cartões, o valores ficavam por certo tempo em posse da empresa recuperanda, que retirava sua parte, e transferia o restante às contratantes, tendo em vista que os valores lhes pertenciam.

A jurisprudência a favor da restituição de valores vem aumentando, e dessa forma o Senhor Relator, do STJ, ministro Villas Bôas Cueva, explica que:

 “( … ) segundo o artigo 49 da Lei nº. 11.101/2005, estão sujeitos aos efeitos da recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido”.

Porém, no caso, as empresas não possuíam um crédito em face da recuperanda, ou seja, não se tratava de uma dívida, mas sim, valores que não lhes foram repassados conforme previa o contrato. Dessa forma, diferencia-se da hipótese do art. 49, mas se enquadra no artigo 85 da Lei nº. 11.101/2005, em que o proprietário de bem que se encontra em poder do devedor na data da falência pode pedi-lo de volta. E assim complementou seu entendimento:

“Ainda que o pedido de restituição não se amolde perfeitamente à recuperação judicial, é útil para demonstrar que, na hipótese de a devedora se encontrar na posse de bens de terceiros, esses não são considerados seus credores, não se podendo falar em habilitação, mas no exercício do direito de sequela”.

Importante mencionar que, na lei de recuperação judicial, extrajudicial e falência, mais especificamente no artigo 50 da norma, consta rol taxativo no qual prevê os meios para realização da recuperação judicial, e lá não está incluída a utilização de valores que pertencem a terceiros.

Nessa esteira, necessário se faz realizar uma análise prévia do crédito pertencente a sua empresa, a fim de entender se de fato é um valor que lhe pertence por meio de contrato, ou se é uma divida adquirida pela recuperanda, para que assim possa se providenciar a medida mais efetiva ao caso concreto, se esta seria por meio de habilitação ou ação própria, para recuperação do valor.

Fonte: Letang Advogados